APRESENTAÇÃO

No contexto atual, o desenvolvimento sócio-econômico de uma nação está muito vinculado ao seu poder de "Estado" frente ás mudanças estruturais das políticas ocorridas no cenário mundial. Países ditos "em desenvolvimento" estão cada vez mais aumentando o seu prestígio diante do mundo, talvez, em função da utilização de um modelo de gestão mais transparente e inovador. Diante dessa constatação, percebe-se que o papel dos gestores públicos, bem como da função e, mais precisamente, da sua forma de atuação, tornam-se cada vez mais importantes perante os desafios a serem superados.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

RESENHA: Reflexão crítica sobre Políticas Públicas sob a ótica de Klaus Frey. Autora: Tatiana David

Klaus Frey é Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Konstanz, Alemanha e atual professor do mestrado em Administração, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Possui experiência na área de Planejamento Urbano e Regional e Ciência Política, com ênfase em Gestão Urbana e políticas públicas, principalmente no que diz respeito à gestão e governança urbana, governança e democracia eletrônica, análise em políticas públicas e, por fim, desenvolvimento sustentável. O texto acima referido foi elaborado pelo autor com a finalidade de revisar e ampliar o segundo capítulo de sua tese de doutorado feita sobre as políticas ambientais dos municípios de Santos e Curitiba.
Frey inicia o seu artigo destacando a importância de se discutir às políticas públicas tendo em vista as várias abordagens e dimensões conceituais necessárias para a melhor compreensão e definição do seu processo de análise. Embora o estudo da temática “políticas públicas ainda não se caracterize de maneira mais contingencial como foco de pesquisas científicas, o autor enfatiza que o assunto, nas últimas décadas, ganhou mais espaço e relevância dentro das ciências política e administrativa.
A intenção de Klaus é ampliar o estudo sobre políticas públicas levando em consideração que a grande maioria das análises feitas sobre este assunto limita-se em apenas estudar os seus campos específicos, de natureza descritiva, não se atentando em avaliar essas políticas através de uma macroabordagem onde instituições, processo e conteúdo políticos se inter-relacionam na tentativa de melhor adaptar a dinâmica real de aproveitamento dessas políticas. Diante disto, analiticamente ele aborda o tema da “policy analysis,” já introduzida por outros autores, que considera a inter-relação das dimensões Instituições, (policy), Processos (politics) e Conteúdo (polity) políticos com a base teórica tradicionais da ciência política.

A defesa deste autor é baseada na tese de que “as peculiaridades socioeconômicas e políticas das sociedades em desenvolvimento não podem ser tratadas apenas como fatores específicos de “polity” e “politics”, mas que é preciso uma adaptação do conjunto de instrumentos da análise de políticas públicas às condições peculiares das sociedades” (p. 215-216). Também, discutiu-se sobre Neo-Instiuicionalismo e estilos políticos duas vertentes da ciência política importantes, segundo o autor, dentro dessa abordagem de análise de políticas.
Klaus destaca a relevância da abordagem de análise de políticas para estruturação de projetos de pesquisa, visto que, muitos estudos empíricos acabam restringindo o foco das pesquisas em face da carência de recursos disponíveis para realizarem os trabalhos, assim os resultados das análises, em geral, ficam pouco expressivos e deficitários no que tange a discussão teórico-conceitual do objeto de estudo.
Ao prosseguir com a defesa de sua tese, Frey levanta vários questionamentos acerca do tema ao afirmar que “As disputas políticas e as relações das forças de poder sempre deixarão suas marcas nos programas e projetos desenvolvidos” (2000, p. 219). Além disso, ele ainda observa que para se conhecer e melhor entender à constituição e o trajeto, os fatores e os bloqueios de programas políticos, tornam-se necessário que a pesquisa se direcione, de maneira substancial, para uma investigação da vida interna dos processos político-administrativos de modo a destacar o papel dos arranjos políticos, as atitudes e objetivos dos atores bem como os instrumentos de ação e estratégias políticas.
Em seguida, ele explana acerca de três categorias que servem de base para a abordagem de análise de política pública a que ele discute. São elas: “Policy Networks”, “Policy Arena” e por fim, “Policy Cicle”. A primeira, assim definida “interações das diferentes instituições e grupos tanto do executivo, do legislativo como da sociedade na gênese e na implementação de uma determinada polícy” (Hecio, 1978, p.102 apud Frey 2000, p.221). Segundo Klaus, para análise de políticas públicas essa categoria é de grande importância, sobretudo enquanto fatores dos processos de conflito e de coalização na vida político-administrativa.
A outra categoria “Policy Arena” refere-se aos processos de conflito e de consenso dentro das diversas áreas de política, as quais podem ser distinguidas de acordo com seu caráter distributivo, redistributivo, regulatório ou constitutivo cuja conseqüência permeia a forma e os efeitos dos meios de implementação e resolução de conflitos políticos. Por fim, e de maneira mais enfatizada ele aborda um dos elementos mais importantes dentro da análise de políticas públicas que é a “Policy Cicle” que se caracteriza e evidencia o caráter dinâmico e temporal de um processo político-administrativo. Essa categoria trata, portanto, do ciclo político dividido na formulação, implementação e controle dos impactos das políticas. Permeando essas fases, Klaus destaca a importante definição inicial da problemática a ser analisada, seguindo da elaboração de programas e decisão, posteriormente, a implementação de tal e por fim a avaliação e eventual correção da política executada. É válido salientar uma questão muito interessante que Klaus levantou dentro dessa categoria cíclica de um processo político. De acordo com ele, muitas vezes os resultados e impactos reais de certas políticas não correspondem aos impactos projetados na fase de sua formulação, ou seja, nem sempre tudo sai conforme o que foi planejado, inúmeras variáveis pode afetar o resultado de uma política ao longo do seu processo de execução. Daí a relevância de se considerar esta categoria, a complexidade temporal e contextual dentro da implementação e análise de uma política pública.
Depois de explorar essas categorias, Frey aborda a questão do neo-institucionalismo, uma temática inovadora que vem reforçar o estudo de análise de políticas sob a ótica estrutural, cuja finalidade é de atribuir, na avaliação de processos políticos, não só os conteúdos da política como também das condições institucionais de cada processo. Segundo ele, as instituições ordenam as redes de relações sociais, regulam a distribuição de gratificações e posições sociais pela definição de metas e da determinação e destinação de recursos, e por fim, sendo elas intermediadas por valores, acabam por representar a índole espiritual da sociedade como um todo.
Por isso, ele completa que o neo-institucionalismo não desenvolve uma “macroteoria de instituições públicas”, mas, na realidade, que o fator institucional é preponderante para explicar acontecimentos políticos concretos. Para Klaus, “A ideia fundamental da abordagem institucional consiste justamente na possibilidade de influenciar processos políticos, e consequentemente, os conteúdos da política por meio da “institucionalização” de padrões de ação e de processos de negociação no contexto de organizações e procedimentos” (p.240).
Contudo, ele salienta que nem sempre se explica tudo, dentro de um processo político, por intermédio deste fator. Para ele, existem determinadas situações, principalmente, em países que transitam por modelos de governo não consolidados em que só o fator institucional não explica todos os acontecimentos políticos, daí e levando em consideração os limites dos fatores institucionais, Klaus evidencia o componente explicativo adicional para entender este acontecimentos que é “o estilo de comportamento político”. Dentro deste estilo de comportamento político destacam-se condicionantes relacionadas aos padrões de política e de comportamento. Os padrões de política dizem respeito aos padrões de comportamento de indivíduos e atores corporativos, de unidades administrativas singulares, de partidos e associações em situações específicas, já quando se analisa o comportamento político trata-se de se avaliar o clientelismo, o paternalismo e a corrupção.
Trata-se de se avaliar os estilos políticos não só com base na cultura, comportamento e atitudes políticas levando em conta as representações de valores, ideias, sentimentos, orientações e atitudes predominantes na sociedade, mas também a partir da influência de vários “fatores como as tradições nacionais e regionais, as estruturas políticas, o grau de desenvolvimento econômico, as ideologias, o treinamento cívico e a própria experiência da prática política, etc. ( Rennó, 1997, p.240 apud Frey, 2000, p.238).
Finalmente, o autor fala da abordagem da análise de políticas no contexto da realidade brasileira. Dentro desse tópico Klaus destaca que a realidade política de países como o Brasil, nitidamente caracterizado como país em processo de democratização e institucionalização, jamais deverá ser analisada com base em modelos de análise utilizados para a compreensão de estruturas já consolidadas, quer dizer, pelo pressuposto da análise tradicional de políticas onde a estrutura institucional do sistema político deve ser encarada como constante e conhecida nas suas características e princípios básicos. O Brasil não poderá se encaixar dentro desse perfil de análise tendo em vista as particularidades socioeconômicas inerentes ao sistema político do país que acabam por provocar a dinamização e temporalidade do seu processo de definição e avaliação.
Diante disso, ele observa os quatro elementos característicos do sistema político brasileiros como fatores determinantes para análise de sua política. O primeiro deles é o fato de que o conhecimento científico sobre política municipal é muito limitado, poucos estudos foram realizados no que tange essa esfera da política brasileira tão problemática. Segundo, destaca-se a discussão acerca da ampla autonomia dos municípios tanto em questões financeiras e administrativas como políticas. Klaus salienta que o fato de Constituição de 1988 ter concedido aos municípios o poder de outorgar a sua própria coordenação fez com o debate com relação ao exercício do poder executivo e legislativo fosse aberto vindo à tona o confronto da variedade de arranjos institucionais dentro do cenário político brasileiro. Fica a indagação, até que ponto essa divisão de poderes é benéfica para construção e análise do sistema político brasileiro?
O terceiro elemento traduz a fragilidade da política do Brasil no que tange ao seu retrospecto histórico que definiu a situação que o país vivencia com relação ao seu processo de transição democrática. Traduz como sendo o entrave de forças políticas no que concerne a luta pela democratização do país, por um lado, forças ideológicas das oligarquias conservadoras, por outro, grupos interessados em modernizar e democratizar o Estado e a Sociedade brasileira. O quarto e último elemento que Klaus coloca é a falta de consolidação e consumação da “Determinação político- ideológica” tanto da população, do eleitorado como também dos políticos e até mesmo dos partidos. Para o autor, o carisma do candidato como político singular pesa mais do que a orientação programática do seu partido e que os brasileiros não costumam organizarem-se em torno de interesses específicos, eles deixam se levar pelas paixões e emoções instantâneas. Resumindo, Klaus explica que tudo isso é reflexo das reviravoltas políticas radicais comuns devido às mudanças dos rumos políticos dos governos que manifestam na descontinuidade de transição entre governos e no próprio decorrer da gestão.
Enfim, o texto de Klaus Frey é bastante categórico ao abordar a temática da análise de políticas públicas no cenário nacional. Ele alerta sobre a importância de se avaliar essas políticas tendo em vista a conjuntura socioeconômica de países em que o cenário político é repleto de contradições e descontinuidade. A ideia do autor é mostrar que o desempenho das instituições públicas e sua capacidade para atender de maneira menos ou mais eficiente o interesse coletivo não resultam só de arranjos institucionais e dos incentivos que elas criam, esse desempenho depende também das atitudes tanto da elite que governa o país como, principalmente, da sua população.
Para o autor, é necessário demandar mais atenção para com o procedimento de constituição de políticas públicas uma vez que “o processo de governança é multifacetado e a ciência deve levar em conta o concurso destas várias facetas que, por sua vez, são resultado de uma interação cada vez mais dinâmica entre elementos institucionais, processuais e os conteúdos das políticas” (p.252).


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